segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Pagamento feito com cartão de crédito é considerado "à vista"


Por Kamila Michiko Teischmann

Embora o Código de Defesa do Consumidor já esteja em vigor há quase 23 anos, as relações de consumo ainda se mostram demasiadamente distorcidas e propensas a beneficiar a parte hipersuficiente da relação, ou seja, o comerciante.

Quando é afixado o valor de algum produto exposto à venda, por óbvio, o comerciante impinge todos os dispêndios e ônus que suportou nesse valor, chegando a um numerário que lhe seja possível auferir lucro, não importando se foi muito ou pouco, haja vista que esses conceitos são absolutamente subjetivos. O fato é que o lucro é certo.

Desse modo, acompanhando os avanços tecnológicos, notadamente quanto à utilização do Cartão de Crédito, que não traz apenas benefícios ao consumidor, mas também ao comerciante, sendo o maior deles a segurança na venda efetuada, ou seja, o risco de “calote” é ínfimo, sendo possível afirmar, inclusive, que pode ser mais segura a compra via Cartão de Crédito que em dinheiro, tendo em vista a possibilidade de falsificação de moeda, muito embora esteja cada vez mais difícil de se realizar.

Portanto, são incontestáveis os benefícios trazidos também aos comerciantes com a utilização do Cartão de Crédito e, assim como o consumidor que paga anuidade para poder usufruir desse instrumento, o comerciante paga taxas para a utilização da máquina. Logo, ambas as partes arcam com o ônus dessa utilização.

Apesar do exposto, é contumaz a ocorrência de valores diferenciados nas vendas em dinheiro, cheque, cartão de crédito e débito. Aqui, será tratado acerca dos valores diferenciados cobrados quando o consumidor opta pela compra com cartão de crédito.

Alguns descontos são concedidos ao consumidor quando prefere pagar à vista, o que é legal. Contudo, “à vista” seria tão somente os valores pagos em cheque (à vista), dinheiro e cartão de débito? A resposta é negativa, devendo ser incluído nesse rol o pagamento com cartão de crédito, desde que não se trate de compra parcelada.

Isso porque, embora possa trazer a falsa impressão em razão de o dinheiro não ser debitado imediatamente da conta do consumidor de que se trata de compra a prazo, é pacífico o entendimento na jurisprudência quanto a impossibilidade de diferenciação dos preços nas vendas feitas por meio de cartão de crédito, considerando tal meio como pagamento à vista. Nesse passo, vejamos decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"Está-se, portanto, diante de uma forma de pagamento à vista e, ainda pro soluto (que enseja a imediata extinção da obrigação). O custo pela disponibilização dessa forma de pagamento é inerente à própria atividade econômica desenvolvida pelo empresário e destinada à obtenção de lucro, em nada se referindo ao preço de venda do produto final. Imputar mais esse custo ao consumidor equivaleria a atribuir a ele a divisão de gastos advindo do próprio risco do negócio (de responsabilidade exclusiva do empresário), o que, além de refugir da razoabilidade, destoa dos ditames legais, em especial, do sistema protecionista do consumidor” [1].

Os próprios PROCONs do país vêm buscando esclarecer à população e coibir o comerciante de realizar tal diferenciação. Vejamos:

Segundo o secretário municipal de Defesa do Consumidor, Procon Fortaleza, João Ricardo Vieira, os valores cobrados pelos lojistas devem ser os mesmos para pagamentos em dinheiro ou pelo cartão de crédito. “O valor que o cartão cobra do comerciante já deve estar diluído no preço geral da loja. Ele já deve colocar isso como custo dos produtos”, explica o secretário. “Se você cobra um preço diferenciando no cartão de crédito, do que é cobrado à vista, isso é abusividade”, afirma João Ricardo Vieira. Conforme o titular do Procon Fortaleza, a aquisição de um produto ou serviço, utilizando como forma de pagamento os cartões de crédito ou de débito, é considerada como um pagamento à vista. [2]
Encontramos, ainda, na Portaria 118/94 do Ministério da Fazenda clara proibição a essa prática. É importante observar o ano em que foi expedida a referida Portaria, 1994, e, apesar disso, parece que jamais existiu.

Art. 1º Dispensar a obrigatoriedade da expressão de valores em cruzeiro real nas faturas, duplicatas e carnês emitidos por estabelecimentos industriais, comerciais e de prestação de serviços, representativos de suas vendas a prazo, inclusive para serem liquidados com prazo inferior a trinta dias, observado o seguinte:

I - não poderá haver diferença de preços entre transações efetuadas com o uso do cartão de crédito e as que são em cheque ou dinheiro; e,

Corroborando com esse entendimento, por fim, buscamos guarida na Lei Consumerista, que em seu artigo 39, inciso V, nos diz:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

Aproveitando o ensejo, é importante destacar que condicionar o pagamento no cartão de crédito a determinados valores também é ilegal, não podendo o comerciante limitar os valores para uso dessa forma de pagamento.

A limitação de valores para compras tanto no cartão de débito como de crédito é outra prática que vem sendo denunciada pelos consumidores. O Código, também no artigo 39, estabelece como prática abusiva, “condicionar o fornecimento de produto ou de serviço a limites quantivativos”. Nos dois casos, o fornecedor está sujeito a penalidades previstas no CDC, com emissão de infração e multa[3] .

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

Pelo breve exposto, podemos, com segurança, afirmar que a venda com cartão de crédito é considerada à vista, e dele podendo o consumidor se valer independente do valor da compra, devendo fazer valer seu direito, exigindo que seja cobrado o valor conforme os preceitos legais.



[1] RONDÔNIA, Ministério Público de. Citação da Terceira Seção do STF. Disponível em: http://www.mp.ro.gov.br/web/guest/pagina-inicial/-/journal_content/56/10102/1467856, acessado em 21/01/2013.
[3] PARANÁ, Procon. Disponível em: http://www.procon.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=299, acessado em 21/01/2013.

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