domingo, 2 de dezembro de 2012

Abono de férias: direito do empregado ou faculdade do empregador?


Nas relações de emprego talvez um dos momentos mais aguardados pela classe trabalhadora é o das férias. Depois de meses de trabalho árduo, encontram recompensa nos 30 (trinta) dias que podem usufruir de descanso sem prejuízo de sua remuneração e com, pelo menos, 1/3 a mais que o salário normal.

Inicialmente, é importante notar que a regra do “terço constitucional”, como é conhecido, previsto no Artigo 7º, XVII da Constituição Federal, não é restrita a concessão de remuneração de 1/3 do salário, portanto, não se pode conceder menos, mas nada obsta que o trabalhador seja contemplado com valor acima do fixado, o que, infelizmente, é muito difícil ocorrer.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;

Feita essa consideração, passamos a analisar o abono de férias, que, embora também traga a mesma fração do terço constitucional acima mencionado, não é a mesma coisa.

O abono de férias é vulgarmente conhecido como a “venda de 10 dias” dos 30 a que tem direito o empregado para usufruir em forma de férias, e está previsto no Artigo 143 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, vejamos:

Art. 143 - É facultado ao empregado converter 1/3 (um terço) do período de férias a que tiver direito em abono pecuniário, no valor da remuneração que lhe seria devida nos dias correspondentes.
§ 1º - O abono de férias deverá ser requerido até 15 (quinze) dias antes do término do período aquisitivo.
§ 2º - Tratando-se de férias coletivas, a conversão a que se refere este artigo deverá ser objeto de acordo coletivo entre o empregador e o sindicato representativo da respectiva categoria profissional, independendo de requerimento individual a concessão do abono.
§ 3o O disposto neste artigo não se aplica aos empregados sob o regime de tempo parcial.

Da leitura do caput do artigo acima transcrito se pode concluir que a conversão de 1/3 do período de férias, ou seja, a venda de 10 dias dos 30 a que tem direito, é uma faculdade do empregado. Contudo, o parágrafo 1º vem esclarecer quando tal direito é uma faculdade do empregado e não do empregador: quando requerido até 15 dias antes do término do período aquisitivo.

Isso quer dizer que se o empregado fizer o requerimento de conversão de um terço das férias em abono pecuniário até quinze dias antes de completar o período aquisitivo de férias ou no prazo previsto na norma coletiva, *a empregadora estará obrigada a acatar o pedido.*[1]

O próprio Ministério do Trabalho e Emprego em seu site esclarece essa dúvida de forma categórica:
A conversão da remuneração de férias em dinheiro depende de concordância do empregador?
Não. È direito do empregado. Se desejar receber o abono de férias, o empregador não poderá recusar-se a pagá-lo.[2]

É importante elucidar o que vem a ser o chamado período aquisitivo de férias.

O período aquisitivo é o fechamento do ciclo de 01 ano de trabalho para que se possa ter direito de usufruir de suas férias. Por exemplo: um empregado admitido em 02/01/2012 fecha o ciclo de seu período aquisitivo em 01/01/2013, isso porque conta-se 01 ano menos 01 dia. Assim, o período concessivo desse empregado do exemplo acima começa em 02/02/2013, podendo o empregador, conforme melhor lhe convir, conceder as férias a partir desse dia, porque a concessão de férias deve acontecer no período que melhor atenda os interesses do empregador. Isso, contudo, não priva o empregado do direito de optar pela venda ou não dos 10 dias das férias a que tem direito.

No que se refere às férias coletivas, o parágrafo 2º do artigo 143 da CLT nos esclarece que deve ser objeto de acordo coletivo o abono de férias aqui tratado.

Assim, não restam dúvidas que o abono de férias, desde que requerido no período de 15 dias antes do término do período aquisitivo é direito do empregado e não faculdade do empregador, que estará obrigado a “comprar” 10 dias das férias. Caso o empregado não requeira o abono de férias no período determinado passará a ser uma faculdade do empregador a conversão ou não de 1/3 do período de férias em abono.



[1] Disponível em: http://sintpq.org.br/newsletter/abono-pecuni%C3%A1rio-de-f%C3%A9rias-individuais
[2] EMPREGO, Ministério do Trabalho e do. Dúvidas Trabalhistas. Disponível em: http://www.mte.gov.br/ouvidoria/duvidas_trabalhistas.asp , acessado em 26/11/2012.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Lei 12.550/2011 e a Cola Eletrônica

    Em 16/12/2011 entrou em vigor a Lei n° 12.550/2011, que, dentre outras matérias, tratou de acrescentar o artigo 311-A ao Código Penal Brasileiro (CPB), que passou a tipificar o crime de fraudes em certames de interesse público:


Art. 311-A.  Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de:    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
I - concurso público;    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
II - avaliação ou exame públicos;    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
III - processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
IV - exame ou processo seletivo previstos em lei:    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput.    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
§ 2o  Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública:    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.    (Incluído pela Lei 12.550. de 2011)
§ 3o  Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário público. 
(grifo meu).

    Assim, qualquer pessoa que se utilizar, ou seja, tiver de posse de gabarito do concurso, vestibular ou qualquer exame ou processo seletivo previsto em lei, bem como aquele que divulgou o gabarito, respondem pelo aludido delito.


    Insta salientar que em sendo o beneficiário ou divulgador do conteúdo sigiloso funcionário público, incorre também no aumento de pena previsto em seu §3º.
 
    Ocorre que, embora de inquestionável importância a tipificação do delito, quando passamos a analisar o tipo incriminador, a conduta do agente, verifica-se que há uma lacuna que precisa ser preenchida.

    Como se pode depreender da letra da lei, o agente deve ter acesso ao conteúdo sigiloso, deve, portanto, saber das respostas do certame em curso. Isso pode significar que, caso o agente tenha acesso a respostas, por meio de "cola eletrônica", seja por aparelho celular, seja por ponto eletrônico, quando, utilizando-se desses meios entra em contato com terceiro que lhe passa as informações conforme for informando as perguntas, o terceiro não teve acesso a conteúdo sigiloso do certamente antecipadamente ou mesmo no momento em que passa as informações, o agente apenas pesquisa e repassa as informações conforme lhe parecer a alternativa correta.

    Assim, pode-se questionar a tipicidade da conduta para tais casos, em que o agente não tem acesso a conteúdo sigiloso, apenas se utiliza de ardil para se beneficiar. 

    Entendo, portanto, que a norma em questão não poderia ser aplicadas nesse último caso, devendo ser aplicada tão somente quando o agente de fato tem acesso a conteúdo sigiloso fornecido por quem o detenha. Dessa forma, só é possível incorrer no delito caso o terceiro esteja com as respostas/gabarito da prova.
 
    Importante mencionar que, no caso de agente que se comunica com terceiro em busca de respostas e, caso esse terceiro não tenha acesso ao conteúdo sigiloso (gabarito) pode, inclusive, correr o risco de fornecer resposta errada, o que não ocorreria se tivesse de fato acesso a conteúdo sigiloso, pois que este é seguro.

    Dessa forma, mesmo havendo aclamado avanço no campo do Direito Penal quanto à proteção da credibilidade dos certames, haja vista os inúmeros casos de fraudes cabalmente comprovadas por todo o país, a norma penal se mostra lacônica, conforme brevemente ilustrado acima.