sábado, 3 de dezembro de 2011

Uma análise crítica do caso "Champinha"


            Em resumo, o então menor de idade, “Champinha", em novembro de 2003 com alguns comparsas teria assassinado Liana Friedenbach e Felipe Caffé por degolação e um tiro na nuca, respectivamente.
“Champinha" cumpriu sua pena imposta de internação e, após completar 21 anos foi liberado compulsoriamente, conforme art. 212 § 5º do ECA:

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.

O juiz da Vara da Infância e da Juventude determinou que fosse feito um laudo por psiquiatras forenses do Instituto Médico Legal. De acordo com os especialistas do IML, "Champinha" revelava uma personalidade de grande periculosidade agindo por impulso, sendo, portanto, incapaz de conviver em sociedade. Ao acatar as conclusões do laudo do IML, o juiz ordenou a internação de "Champinha", por tempo indeterminado, na clínica psiquiátrica do Hospital de Tratamento e Custódia, na cidade de São Paulo.
O fato de ter o Magistrado aplicado novamente uma pena, pois não há como definir a nova medida de internação se não como uma pena em razão de já ser o infrator maior de idade, pode ter acarretado no chamado bis in idem, posto que, em regra, ele já teria cumprido sua pena inicialmente imposta e, essa se extinguiu em razão da maioria, o que é expresso no ECA.
No caso em questão, supondo que “Champinha" não tivesse atingido a maioridade, caberia medidas socioeducativas de semi-liberdade ou liberdade assistida, conforme art. 121, §4º do ECA “Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida”. Porém, esse não foi o caso, o que colocou o Magistrado em situação delicada.
A necessidade de se fazer algo frente a constatação dos especialistas acerca do quadro psicológico do infrator traz importante discussão a tona: seria o caso “Champinha” uma exceção a regra, aceitável?
No caso em baila, diante do comportamento reprovável, dentro e fora do estabelecimento de internação, comprovando que não fora ressocializado, tampouco estando apto a conviver em sociedade de forma a não oferecer riscos, pelo contrário, sendo atestada sua periculosidade, é compreensível que deva haver certa “elasticidade” da lei em vigor para que de fato se faça a tão esperada justiça, muito embora isso custe literalmente ignorá-las.
É fato que, devido aos acontecimentos diários e incidência cada vez maior de crianças e adolescentes no mundo do crime nos faz ansear ainda mais a alteração do ECA, que não vem sendo o suficiente para a inibição e principalmente, para a efetivação de ressocialização do infrator.
Partindo-se da interpretação “fria” da lei, tem-se que o que houve no caso “Champinha” foi uma arbitrariedade, ocorrendo de fato o vedado bis in idem, tendo em vista que sua pena se exauriu, conforme previsto no ECA e, portanto, estando livre de punições duplas por uma única pena.
Contudo, do ponto de vista razoável, e esse certamente deve prevalecer, buscando-se a efetiva realização de justiça, tanto para a sociedade quanto para o próprio infrator, já que esse também deve ser protegido de si mesmo (seus atos), eis que tivemos uma decisão acertada do Magistrado, que decidiu interna-lo por tempo indeterminado em clínica psiquiátrica, onde lá permanece até hoje.
A Constituição de Republica Federativa do Brasil de 1988, vem a calhar para “Champinha”, já que essa indeterminação de sua internação, nada mais é que uma perpetuidade da punição, em ser art. 5º, XLVII, “b’:

XLVII - não haverá penas:
b) de caráter perpétuo;

No entanto, também temos que a segurança pública também é dever do Estado, conforme caput do art. 144 da CRFB. Tudo isso só mostra que a situação tem de fato duas medidas e, no caso em concreto, o interesse social prevalece sobre o privado. Ainda há quem diga que a internação imposta após a liberação compulsória tem caráter civil e não criminal.
Corroborando com a posição de que foi acertada a decisão imposta, temos que, desde que fora proclamada, nenhuma objeção feita foi capaz de derrubá-la, o que prova que não existe outra alternativa mais coerente, tendo em vista a latente falha em nosso ordenamento jurídico para sanar tal celeuma.